Categoria: Blog

  • Numa alameda ectoplasmática

    Numa alameda ectoplasmática

    Sim, vi, a mim mesmo, de novo, meu rosto, um rosto; não este, que o senhor razoavelmente me atribui. Mas o ainda-nem-rosto – quase delineado apenas – mal emergindo, qual uma flor pelágica, de nascimento abissal… E era não mais que: rostinho de menino, de menos-que-menino, só. Só.   — João Guimarães Rosa, Primeiras estórias…

  • do mar; Correspondência

    do mar; Correspondência

    “Enquanto isso, Melquíades acabou de plasmar nas suas placas tudo o que era plasmável em Macondo e abandonou o laboratório de daguerreotipia aos delírios de José Arcadio Buendía, que tinha resolvido utilizá-lo para obter a prova científica da existência de Deus. Mediante um complicado processo de exposições superpostas, tomadas em lugares diferentes da casa, estava…

  • Tempestade de morcegos

    Tempestade de morcegos

    A noite tempestuosa não era boa companhia para o pequeno Alfredo. Seus olhos permaneciam abertos, alertas, atentos com o som dos coices raivosos do vento. As telhas da casa miúda estremeciam ansiosas no telhado. Qual destino teriam se fossem levadas montanha abaixo? Talvez atingissem algum carro estacionado, ou talvez tomassem um rumo mais mórbido, quebrando…

  • Larvas em pêssegos maduros

    Larvas em pêssegos maduros

    Sinto falta da emoção que é estar por trás das cortinas de um palco. Crianças enfileiradas na escadaria segurando os violinos perfeitamente posicionados para não dar vexame, porque tudo ali é uma cerimônia. As camisetas brancas grandes demais para os pequenos corpos, estampadas com o logo da orquestra sinfônica naquela estética específica do início dos…

  • O oceano tem fim

    O oceano tem fim

    Pudera eu enterrar as referências pelas quais moldei quem eu sou. Pudéssemos nós apagar da memória as coisas ruins que nos fizeram, ou as que fizemos aos outros. Poderíamos ser essa caixa vazia de imaginação, de retalhos sem sentido, que é plástica, sebosa e frívola. Não somos nada disso. A condição humana não nos permite…

  • Pedala, vagabundo

    Pedala, vagabundo

    É com grande pesar que anuncio a morte da minha mais adorada bicicleta amarela. Num final de semana qualquer, em uma decisão que custou a sua vida, decidi subir uma ladeira. Compartilhando fuligem com os carros, tomando lapadas de areia no rosto e trocando inutilmente as marchas deterioradas por duas décadas sem manutenção, o esforço…