Uma cabana de madeira no meio do campo. À noite cria uma visão perturbadora e solitária. Em pé, ao relento e a um sopro de cair, imita a estrutura conhecida como Torre de Pisa. Os matos e fungos crescem em volta, abraçando a edificação acinzentada pela força do tempo. De mãos dadas com a mãe, o menino com os pés pequenos e bexiga apertada não quer de jeito nenhum entrar lá. Conhece aquele orifício oval que engole seu traseiro; teve pesadelos com ele. A luminosidade dourada da lâmpada de filamento faz da urina um espelho tenebroso.
Na latrina não existe gênero. O banco alto demais para o garoto o obriga a se sentar, de modo que a mãe segura seus bracinhos para que ele não seja engolido pelo abismo.
A roça toda era assim. Consequentemente, o menino começou a filtrar os banheiros nos quais entrava. Se via uma latrina no horizonte esperava chegar em casa para ir ao banheiro. Se não pudesse aguentar, corria até algum canto reservado e regava as plantinhas. Na latrina não entro.
Às vezes era obrigado a ir com os pais num casamento ou num churrasco em comunidades do interior. Os salões de festa feitos de tijolo e cimento chapiscado absorviam o odor dos sanitários em suas superfícies porosas. Num instante, ao averiguar o local, ele diagnosticava se o banheiro era limpo ou não. Em geral, se o cheiro fosse estranho, nem precisava olhar as privadas, porque sabia que estariam em situação calamitosa.
Nem me venha com mictório. Achava um absurdo ter que ficar nu ao lado de outros homens desconhecidos. Ainda acha. Por que isso existe? Ficava indignado com a poça formada no piso vermelho. Cadê a pontaria? Ardia de fúria quando percebia que alguns banheiros masculinos não tinham as cabines individuais com porta.
Por isso, ainda pequeno, começou a ir com a mãe ao banheiro feminino: era mais limpo e as mulheres o tratavam melhor. Já via cedo a pressão de ser macho ao puxar para fora o seu negócio ao lado dos homens e meninos; isso o fazia detestar as inevitáveis esvaziadas de joelho.
O menino virou homem e saiu do interior. Em uma de suas férias, munido da câmera fotográfica, viu-se diante de um banheiro que fez parte da sua tenra infância. As nuvens faziam riscos no céu enquanto a lua projetava seu reflexo branco nas paredes carcomidas do pequeno casebre abandonado. Com a câmera posicionada em um tripé, o jovem fotógrafo em formação abriu as cortinas do tempo e prendeu o banheiro na eternidade da imagem.
Encarou o passado naquela noite fria como um sonho perdido nas entranhas da memória.
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